Se é um poema fraterno que pedis, Arrancai-o de mim, escavando-lhe a raiz, E plantai-o no vosso coração.
Nunca pegou nenhum? Tão infeliz Era o terreno da plantação!
Miguel Torga in Poesia Completa Ed. D. Quixote, 2000
dezembro 28, 2010
«Pela primeira vez, há muito tempo, pensei na minha mãe.
Julguei ter compreendido porque é que, no fim de uma vida, arranjara um “noivo”, porque é que fingira recomeçar.
Também lá, em redor desse asilo onde as vidas se apagavam, a noite era como uma treva melancólica.
Tão perto da morte, a minha mãe deve ter-se sentido libertada e pronta a tudo reviver.
Como se esta grande cólera me tivesse limpo do mal, esvaziado da esperança, diante desta noite carregada de sinais e de estrelas, eu abria-me pela primeira vez à terna indiferença do Mundo.»
(Albert Camus, O estrangeiro)
Um texto mágico, a que costumo associar este outro:
«Em que meditas, meu amigo? Será nos teus antepassados? Todos eles são pó no pó. Meditas nas virtudes deles? Repara só como sorrio. Toma desta copa e bebamos, Ouvindo sem inquietação O grande silêncio do mundo.»
Omar Khayyam, Rubaiyat
dezembro 24, 2010
Sou eu que te penso antes de teres existido. Pensando te crio um nome como te invento um rosto e nos olhos a cor onde me reflicto mas não o exacto lugar onde moras e me fixo. No ontem perdido em ti recupero o tempo e o cisco. No sonho redimo o que só a viver tem sentido.
Fernando Namora
dezembro 22, 2010
Astrónomos da Agência Espacial Norte-Americana (NASA) identificaram o buraco negro mais pequeno até agora conhecido. O J1650 tem uma massa quatro vezes maior do que o nosso Sol e o tamanho aproximado de uma grande cidade.
Que no espaço de uma grande cidade caiba uma massa quatro vezes a do Sol, - a qual é 333 mil vezes a da Terra -,
é caso para nos deixar abismados com tão absoluta diferença em relação ao nosso mundo familiar! ...
dezembro 20, 2010
Epístola para os amados
Ainda vos amo, porque aqui não há só tempo e o amor, no tempo, é tão intenso e absoluto, que transborda do tempo para o não-presente. Havendo tempo e não-tempo, eu vos confesso agora que em parques ao poente ainda vos estou a amar. E não que vos ofereça hoje alucinados versos, mas porque do meu tempo sois donos, como os poemas que eu escrevo do tempo para o não-tempo, sempre.
Fiama Hasse Pais Brandão
dezembro 18, 2010
Amar o mar completa a minha vida com o tacto de um amor imenso. Fiama Hasse Pais Brandão
dezembro 15, 2010
Amar o Universo não me traz mágoa. Sobretudo, amar a areia arrebata-me de júbilo e paixão.
Fiama Hasse Pais Brandão
dezembro 13, 2010
Anton Einsle, head and upper torso of a reclining woman img in "Branco no Branco"
«[ ] O que é preciso é ser como se já não fôssemos,[ ], pois o resto não nos pertence.» cecília meirelles
dezembro 10, 2010
Para a meg, herself :):
Não queiras mais que a gratuita lucidez do instante sem caminho Não julgues que ele é mais do que a casual aragem de não ser mais nada do que o voluptuoso fluir de um puro vazio
Em distraído vagar como uma leve nuvem torna-te vago também deixa ascender em ti essa torre ténue que quer a transparência e a graça flexível de pertencer ao ar
Não queiras conhecer o que há por trás desse fulgor puro se é que há algo por detrás Aceita a sua dádiva gratuita porque ele é precisamente nulo e tão essencial como o ar que se respira António Ramos Rosa, As Palavras, Campo das Letras, Porto, 2001
dezembro 09, 2010
UM JARDIM (AZEITÃO)
Se eu disser que havia uma cascata _________________________de jardins descrevo a casa com o traçado do seu estilo ou uma associação vulgar sobre as quedas curvas _____________________________________da folhagem
Desci pelos socalcos da mansão com o terror de qualquer alma ou ânimo poder __________________________vogar preso aos aromas pela mesma sensibilidade que me fazia sentir as flores como punhais _________________________________ou ameaças
Tombou-me aos pés todo o corpo natural ____________________________daquele jardim configurado.
A nova folhagem saia do tear ____________________tal como a vi orvalhada e gélida nesse paço arruinado próprio na minha época para simbolizar o desértico.
Estes prismas já perderam o sentido ____________________________dos seus traços originais, o seu estilo ou figura legível há duas centenas de anos. Hoje a hera envolve com nós excessivos as torres.
Das janelas ovais só existe este texto ____________________________porque não as vejo ocultas no volume estilizado híbrido, que une a casa ao jardim e a um lago, repartido entre o mundo vegetal, a aparência da casa _______________________________que se reflecte e a intenção decorativa ________________que eu não confirmo.
Não lamento que o tempo desdoire os cálices __________________________________ácidos do enxame. Nem que a água estagne no fosso no ponto por onde passo entre os espectros _______________________________do pomar
para outra sequência irreconhecível. Desejo no pensamento aqueles meses em que era perfeita a relação _______________________________entre tudo o que aqui é disperso, o único momento vivo em que o plano do arquitecto, assim como o do paisagista, ________________________e a vitalidade dos moradores concebiam o estilo pelo qual a presença destes insectos atordoados nesta cascata seca era ordenada e emocionava.
Porque cada coisa existe pela conjunção _______________________________das suas formas, a pata do escaravelho é nula como elemento do estilo, a não ser que eu aceite uma parcela da destruição _________________________como outra existência actual, o estado posterior das figuras que decaíram ou o das emoções desaparecidas entre o tecido de símbolos ocultos de uma geração.
Fiama Hasse Pais Brandão
dezembro 07, 2010
dezembro 05, 2010
Lorenzo Bartolini (1777-1850)
Incêndio numa hipótese de amor
Encontrei o segredo, a chave de vidro das palavras que escrevo; e tenho medo. Talvez nos campos imensos, onde o lírio floresce, na margem de rio que abriga, de manhã cedo, os teus pés de ninfa, num engano de idade, me tenhas visto à sombra de um rochedo; e se os teus lábios, entreabertos num torpor de romã, me tocaram num sonho bêbedo, deles só lembro, imprecisos, fluxos de incêndio numa hipótese de amor.
Nuno Júdice
dezembro 03, 2010
«Houve um ano em que as andorinhas se esqueceram de partir. Comovidos, os deuses adiaram o começo do inverno. Nesse ano, uma mulher e um homem se fundiram em barco feito vento e partiram sem rumo e sem dar notícias: como se fora de cinza o nome que usaram. Agora, nenhum horário retarda o êxodo das últimas andorinhas em direcção ao sol.
Diz-me, meu amor, onde se cruza a tua sombra com a minha. Diz-me em que crónica de espanto te tornaste o marinheiro que debandou de encontro ao deslumbramento das manhãs.»
Graça Pires, Reino da Lua
dezembro 01, 2010
Tentação
Vénus lançada à praia pelo mar inquieto, Inquietas os meus olhos, sátiros cansados. Vem de ti uma luz que o sol não tem, E sózinha povoas o areal. Que me queres, nesta idade sonolenta Dos sentidos? Lembrar-me e convidar-me a renegar Os desejos despidos? Como se algum poeta se esquecesse E arrependesse Dos antigos pecados cometidos!
Miguel Torga, Antologia Poética
novembro 29, 2010
ASAS MALIGNAS
Vejo sobre a grandiosa árvore de palma a contraluz as cegonhas como aracnídeos talvez através de um véu de cassa. Esta visão isola-me do mundo e beneficamente reconduz-me depois aos significados que formam o mundo. Nunca as cegonhas me tornaram excêntrica de mais, apenas íntima a elas e estranha a outros restos de sentido.
A brisa que confunde as asas temíveis com as varas agitadas de palma, a restante brisa que sopra em outras copas, qualquer outra árvore que dobrando-se simula também um par de asas malignas, toda essa aragem dupla que redemoinha entre árvores firmes eleva as telas frágeis das asas. Que mensagem posso dar para além da aberração dos colos enlaçados como um insecto a estrebuchar num precipício real elevado? Até os fios da teia na treva mesmo que se assemelhem a folhas são cada vez mais angulosos, embutidos na noite como garras. O casal de cegonhas é um alvo demasiado fascinante para eu sustentar o olhar nos seus círculos. Entre a noite e as imagens que me suscita esse ponto branco, o par, giram em volta frestas luminosas, para que alguém as agrupe num indício. O resto do tufo das árvores tornou-se uma imagem desapercebida porque já desde o princípio o seu movimento ofuscado contrastava com as asas negras.
Fiama Hasse Pais Brandão
novembro 27, 2010
«Quando se realiza, muito do que se pensa se perde. Quando se constrói uma casa, a maior parte do universo fica de fora; mas quando se destrói uma casa, a cosmogonia fica dentro.»
Maria Gabriela Llansol, Um arco singular - Livro de Horas II, Assírio & Alvim, Lisboa, 2010, p.222
novembro 25, 2010
Aleksandr Aleksandrovich Deineka, Jovem Mulher com um Livro (1934)
«De difícil memória era, sim, para raros.
O que aconteceu com a Poesia foi que esta matéria sem tempo facilmente se memoriza no espaço gráfico.
E a terrível democracia leitora multiplicou então estes papéis silenciosos e multiplicou os olhos silenciosos que sabem ler,
acabando com o melódico analfabetismo.
Fiama Hasse Pais Brandão
novembro 23, 2010
(M. Jagger/K. Richards)
Please allow me to introduce myself I'm a man of wealth and taste I've been around for a long, long years Stole many a man's soul and faith
And I was 'round when Jesus Christ Had his moment of doubt and pain Made damn sure that Pilate Washed his hands and sealed his fate
Pleased to meet you Hope you guess my name But what's puzzling you Is the nature of my game
I stuck around St. Petersburg When I saw it was a time for a change Killed the czar and his ministers Anastasia screamed in vain
I rode a tank Held a general's rank When the blitzkrieg raged And the bodies stank
Pleased to meet you Hope you guess my name, oh yeah Ah, what's puzzling you Is the nature of my game, oh yeah (woo woo, woo woo)
I watched with glee While your kings and queens Fought for ten decades For the gods they made (woo woo, woo woo)
I shouted out, "Who killed the Kennedys?" When after all It was you and me (who who, who who)
Let me please introduce myself I'm a man of wealth and taste And I laid traps for troubadours Who get killed before they reached Bombay (woo woo, who who)
Pleased to meet you Hope you guessed my name, oh yeah (who who) But what's puzzling you Is the nature of my game, oh yeah, get down, baby (who who, who who)
Pleased to meet you Hope you guessed my name, oh yeah But what's confusing you Is just the nature of my game (woo woo, who who)
Just as every cop is a criminal And all the sinners saints As heads is tails Just call me Lucifer 'Cause I'm in need of some restraint (who who, who who)
So if you meet me Have some courtesy Have some sympathy, and some taste (woo woo) Use all your well-learned politesse Or I'll lay your soul to waste, um yeah (woo woo, woo woo)
Pleased to meet you Hope you guessed my name, um yeah (who who) But what's puzzling you Is the nature of my game, um mean it, get down (woo woo, woo woo)
Woo, who Oh yeah, get on down Oh yeah Oh yeah! (woo woo)
Tell me baby, what's my name Tell me honey, can ya guess my name Tell me baby, what's my name I tell you one time, you're to blame
Oh, who woo, woo Woo, who Woo, woo Woo, who, who Woo, who, who Oh, yeah
What's my name Tell me, baby, what's my name Tell me, sweetie, what's my name
Woo, who, who Woo, who, who Woo, who, who Woo, who, who Woo, who, who Woo, who, who Oh, yeah Woo woo Woo woo
novembro 21, 2010
«[ ] não vislumbrei as nascentes do Tigre e do Eufrates,
que talvez nesse labirinto de ruas de água que suportam
o mundo / a vida presente, Tejo-rio se tenha perdido.»
Maria Gabriela Llansol, Um arco singular - Livro de Horas II,
Assírio & Alvim, Lisboa, 2010, p. 233
novembro 19, 2010
Christopher Latham Sholes, inventor que deu início à indústria de máquinas de escrever. Sholes acreditava que sua invenção fora fundamental na emancipação feminina, pois possibilitou que a mulher ingressasse no mercado de trabalho dos escritórios. (Herkimer County Historical Society)
«Escrevem à máquina em face deste campo; milhões de folhas de papel para triliões de folhas de árvores; mulheres sentadas oito horas por dia a escrever cartas e a dar forma lapidar à evidência. Senhor doutor, senhor ovo de sabedoria, senhor de gema perdida; é o meio-dia das duas horas livres para continuar à tarde; com este horário de contenção biológica, com esta incubadora de leis, política vai gerando político, eternamente.
Acumulam-se informaçóes, mas o Estado, composto por estes milhões de homens machos que vomitam frases e testículos e lugares comuns de há séculos, não vota a lei do seu desaparecimento.»
Maria Gabriela Llansol, Uma data em cada mão - Livro de Horas I, Lisboa, Assírio & Alvim, 2010, p. 95
novembro 17, 2010
Tamara de Lempicka
«Sim, diz-me a mulher, pousando as mãos nos meus joelhos.
Desejo encontar alguém que me ame com bondade e que seja um homem.
Alguém que queira ressuscitar para ti? Sim, alguém que tenha para comigo essa memória.»
maria gabriela llansol, amigo e amiga, Assírio & Alvim, Lisboa, 2006, p.240
novembro 16, 2010
Se uma coisa existe, esse facto prova que ela é possível.
Uma coisa comprovada possível, mas que não exista,
que espécie de realidade tem? A realidade deve
restringir-se ao que existe ou também
alargar-se ao que é possível existir?
E não haverá coisas possíveis
de existir que nós, humanos,
desconhecemos, como aliás
desconhecemos muitas
coisas que existem?
Ora, pergunto,
essas coisas
ignotas,
mas
existentes
ou
possíveis,
são ainda realidade?
E se nós,
que meditamos
sobre a realidade,
nem sequer existíssemos,
mas o mundo fosse tal como
o conhecemos (e desconhecemos),
o que seria então a realidade sem
ninguém para a percepcionar,
senão potencialmente?
novembro 15, 2010
novembro 13, 2010
«É que levantar os olhos, de cá de baixo, da terra, para uma nuvem é a melhor forma de interrogar os nossos mais íntimos desejos.»
André Breton, O amor louco, («L’amour fou», 1937), trad. Luísa Neto Jorge, Lisboa, Estampa, 1987, p.112
novembro 11, 2010
Renoir
Era um dorso como uma face sem rosto
como se fosse um campo inteiro um estuário a forma imóvel do vento com um fulgor de lava
Era um círculo do abandono puro a densidade absoluta de um repouso a lisa nudez do ser completo António Ramos Rosa
novembro 09, 2010
Regressar ao objecto. Partilhar a figura na ressurreição. A ausência não é o nada, mas o manancial. De um lado e de outro, vigiam-nos as formas naturais consonantes. Conseguiremos atenuar na Natureza o afastamento. Assim como tu, ela assgura-me a emoção. A separação é o abstracto de vários vestígios. Um vestígio do próximo reconhecimento. Tanto mais sei que regressas ao abismo da minha memória subtil. És tu quem se ausenta entre uma ala de árvores. Pertences à Natureza, tanto quanto te pertences.
Fiama Hasse Pais Brandão
novembro 08, 2010
Portugal produz por ano bens e serviços no valor de aprox. 150 mil milhões de euros, 30 mil milhões de contos.
Ao estrangeiro deve cerca de 300 mil milhões, i.e. 2 anos de produção; metade da dívida é do Estado, a outra metade é devida pelos bancos, empresas e famílias.
Mudar esta dependência dos credores exige que as empresas, o estado, as famílias paguem o que devem,
aceitando manter algum nível de dívida digamos entre ¼ ou ½ da produção anual, ou seja entre 37 e 80 milhões de euros.
Uma redução do endividamento desta grandeza, de 300 para digamos 50 mil milhões, em p.e., 5 anos, exigiria uma amortização anual de 50 mil milhões, ou seja 1/3 do produto anual, um quadrimestre de produção.
Se alargarmos o período de redução da dívida de 5 para 10 anos, mesmo assim, 2 meses de produção e rendimento teriam de aplicar-se anualmente ao pagamento da dívida.
Vendo o problema em termos per capita, na perspectiva de rendimento de um assalariado ou pensionista,
2/14 a 4/14 avos do rendimento anual algo como 15 a 30 % do salário ou pensão tem de ser pago aos credores,
ou na forma de redução do consumo ou na de passar a produzir em 3 dias tanto quanto antigamente em 4 dias;
isto em paralelo com idêntico sacrifício nos rendimentos dos pensionistas, rentistas, capitalistas e usurários.
No quadro desta situação é inadmissível não exigir austeridade a todas as instituições e classes sociais.
novembro 07, 2010
Les sabots d'Hélène Etaient tout crottés Les trois capitaines L'auraient appelée vilaine Et la pauvre Hélène Etait comme une âme en peine Ne cherche plus longtemps de fontaine Toi qui as besoin d'eau Ne cherche plus, aux larmes d'Hélène Va-t'en remplir ton seau
Moi j'ai pris la peine De les déchausser Les sabots d'Hélèn' Moi qui ne suis pas capitaine Et j'ai vu ma peine Bien récompensée Dans les sabots de la pauvre Hélène Dans ses sabots crottés Moi j'ai trouvé les pieds d'une reine Et je les ai gardés
Son jupon de laine Etait tout mité Les trois capitaines L'auraient appelée vilaine Et la pauvre Hélène Etait comme une âme en peine Ne cherche plus longtemps de fontaine Toi qui as besoin d'eau Ne cherche plus, aux larmes d'Hélène Va-t'en remplir ton seau
Moi j'ai pris la peine De le retrousser Le jupon d'Hélèn' Moi qui ne suis pas capitaine Et j'ai vu ma peine Bien récompensée Sous le jupon de la pauvre Hélène Sous son jupon mité Moi j'ai trouvé des jambes de reine Et je les ai gardés
Et le cœur d'Hélène N'savait pas chanter Les trois capitaines L'auraient appelée vilaine Et la pauvre Hélène Etait comme une âme en peine Ne cherche plus longtemps de fontaine Toi qui as besoin d'eau Ne cherche plus, aux larmes d'Hélène Va-t'en remplir ton seau
Moi j'ai pris la peine De m'y arrêter Dans le cœur d'Hélèn' Moi qui ne suis pas capitaine Et j'ai vu ma peine Bien récompensée Et dans le cœur de la pauvre Hélène Qu'avait jamais chanté Moi j'ai trouvé l'amour d'une reine Et moi je l'ai gardé
novembro 06, 2010
Não ouvia esta canção desde a minha alta meninice!
:)
E o Júlio Isidro ensinou-me hoje na rádio que foi Patachou quem apresentou Georges Brassens ao público!
novembro 04, 2010
SEGREDO
Não contes do meu vestido que tiro pela cabeça
nem que corro os cortinados para uma sombra mais espessa
Deixa que feche o anel em redor do teu pescoço com as minhas longas pernas e a sombra do meu poço
Não contes do meu novelo nem da roca de fiar
nem o que faço com eles a fim de te ouvir gritar
Maria Teresa Horta
novembro 02, 2010
imagem in blog 'coisas minhas'
«Diz toda a Verdade mas di-la tendenciosamente – O êxito está no Circuito É demasiado brilhante para o nosso enfermo Prazer A esplêndida surpresa da Verdade
Como o Relâmpago se torna mais fácil para as Crianças Com uma amável explicação A Verdade deve ofuscar gradualmente Ou cada homem ficará cego –»
Emily Dickinson
outubro 31, 2010
Não há como vê-lo nesta noite sem luar — estou deitada e desperta, os seios ardendo em desejo e o coração em chamas.
Ono No Komachi (834?-?)
outubro 29, 2010
«Quebrei os meus compromissos por causa do amigo; seria capaz de quebrar a amizade por causa do amor.»
(Hölderlin)
outubro 27, 2010
Quadro de Melyta
«Não sei se este pensamento elucida o dia, se a noite. Veio às cinco da manhã, e às dezoito do mesmo dia. Aqui o deixo__________________________ a ilha é
Um lugar onde o mar ruge por todos os lados. Quando O vento a submerge, batem nas rochas e nas escarpas Peixes, assinalados por terem morrido em vão.»
Maria Gabriela Llansol, O começo de um livro é precioso Assírio & Alvim, Lisboa, 2003, p.196
outubro 25, 2010
«Mas a ti nem mil impropérios seriam capazes de te morder. Tal é o impudor inato que possuis.»
Eurípedes, Medeia (1344-5)
outubro 23, 2010
«As folhas da bananeira são suficientemente amplas para ocultarem uma paixão. Quando expostas às intempéries recordam-me ora a cauda ferida de uma fénix ora um leque verde rasgado pelo vento. A bananeira floresce. Todavia as suas flores nada têm de atraente. O mesmo acontece com o tronco enorme. Talvez por isso a bananeira acabou por conquistar o meu coração. Sento-me debaixo dela enquanto o vento e a chuva a fustigam.»
Matsuo Bashô, O gosto solitário do orvalho, Assírio & Alvim, Lisboa, 2003, p. 15
outubro 21, 2010
Do Raio de Sol
Raio de Sol na ombreira da porta, na trave da cadeira, vindo da gelosia, peço-te para amanhã voltares mais arqueado pela esfericidade da Terra, um raio não decididamente recto cravado no meu tórax côncavo, mas no meu coração curvo como um globo
Fiama Hasse Pais Brandão, As fábulas
outubro 19, 2010
Devota como ramo curvado pelos nevões alegre como fogueira nas colinas esquecidas
sobre acutíssimas lâminas em branca camisa de urtigas, te ensinarei, minha alma, este passo do adeus...
----- // -----
Devota come ramo curvato da molte nevi allegra come fallò per colline d'oblio,
su acutissime làmine in bianca maglia d'ortiche, ti insegnerò, mia anima, questo passo d'addio...
Cristina Campo, O Passo do Adeus, Trad de José Tolentino Mendonça; Assírio & Alvim, pp. 38-39
outubro 15, 2010
outubro 13, 2010
Numa destrinça subtil, cada um traz a sua ausência.
Mas há uma escala graduada de valores libidinais,
onde a muda ausência da amada, muda a beleza dessa ausência.
(texto de gabriela llansol adaptado)
outubro 11, 2010
Paul Valéry: Le cimetière marin
Ce toit tranquille, où marchent des colombes, Entre les pins palpite, entre les tombes; Midi le juste y compose de feux La mer, la mer, toujours recommencée O récompense après une pensée Qu'un long regard sur le calme des dieux!
outubro 10, 2010
Ismael Nery, Figura, c. 1927/1928 óleo s/ tela, 105 x 69,2 cm
O CORPO OCUPA A FIGURA
Assombra-me o som parcimonioso da flauta, com limites,
pelo declive. O meio-dia é a hora em que assoma o corpo,
flamejando, progredindo para o exterior ou para o interior
do progresso para a proximidade. Não passar pelo Nada,
a escutar a fonia dos animais animados. Não recuar perante
a Natureza, ofensiva portadora da dor, terrífica separação.
Com os sentidos perante a ordem possível. Uma única gare torna a coesão soma das partes coagindo-se; aquela vem,
cabendo ainda no olhar de acesso. O individual é definido
por uma discordância interior. Justaposição do caos sereno à cena,
por um ovíparo que esvoaça tal como no soalho tenebroso
prosseguem melros.1 Meio-dia! Trinos! O corpo ocupa a figura,
desocupa-a. No panorama o som voador de flauta desliza
no corpo ensombrecido pela sombra do corpo da figura.
1 «Ce toit tranquille où marchent des colombes», P. Valéry
Fiama Hasse Pais Brandão
Nota:-As linhas diferem, em extensão, dos versos originais.
La faculté du bovarisme c’est «le pouvoir départi à l’homme de se concevoir autre qu’il n’est.» (Jules de Gaultier) _____________________________________________
«[ ] voici, avec Mme Bovary, un être pourvu d’une énergie plus forte. Aussi la fausse conception qu’elle prend d’elle-même va-t-elle se traduire par de tout autres conséquences. Mme Bovary échappe au ridicule par la frénésie; avec elle, l’erreur sur la personne devient un élément du drame. Au service de l’être imaginaire qu’elle a substitué à elle-même elle emploi toute l’ardeur qui la possède. Pour se persuader qu’elle est ce qu’elle veut être, elle ne se tient pas [à des] gestes décoratifs […], mais elle ose accomplir des actes véritables. Or elle entreprend sur le réel avec des moyens qui ne sont valables qu’à l’égard de la fiction. La conception sentimentale qu’elle s’est formée d’elle même exige un effet une sensibilité différente de celle qui est la sienne, en même temps que des circonstances différentes de celles dont elle dépend.»
«O pano preto, juncado de pétalas brancas, levantava-se por vezes descobrindo o caixão.
Os portadores, fatigados, iam mais vagarosos; e o féretro avançava por intercadências contínuas, como uma chalupa baçouçando entre as ondas.
Chegaram. Os homens continuaram até um sítio baixo, onde a cova estava aberta. No meio da relva.
Agruparam-se em torno; e enquanto o padre falava, a terra vermelha, puxada para os bordos, escorregava pelos cantos, sem ruído, continuamente.
Depois de disporem as quatro cordas, impeliram o ataúde. Carlos viu-o descer. Descia sempre.
Por fim ouviu-se o embate, as cordas subiram rangendo.
Então Bournisien pegou na pá que Lestoboudois lhe estendia; e com a mão esquerda deitou-a cheia de terra, vigorosamente, enquanto aspergia com a direita; e a madeira do caixão, no choque com os grossos torrões, produziu o ruído formidável que soa aos nossos ouvidos como o eco da eternidade.»
«Estava bom tempo; era um daqueles dias de Março claros e agrestes, em que o Sol reluz num céu pálido. Habitantes de Rouen, endomingados, passeavam com ar satisfeito. Ema chegou ao adro da igreja. Saíam da missa da tarde; a multidão escoava-se pelos três portais, como um rio pelos três arcos de uma ponte, e, no meio, mais imóvel que um rochedo, estava o guarda.
Lembrou-se ela então do dia em que, ansiosa e cheia de esperança, caminhara sob aquela grande nave que se alongava na sua frente, menos profunda que o seu amor; e continuou a andar, chorando debaixo do véu, aturdida, cambaleante, quase a desfalecer.»
«Elle venait de partir, exaspérée. Elle le détestait maintenant. [ ]
Puis, se calmant, elle finit par découvrir qu’elle l’avait sans doute calomnié. Mas le dénigrement de ceux que nous aimons toujours nous en détache quelque peu.
Il ne faut pas toucher aux idoles: la dorure en reste aux mains.»
«[…] C’était une manière de permission qu’elle se donnait de ne point gêner dans ses escapades. Aussi en profita-t-elle tout à son aise, largement. Lorsque l’envie la prenait de voir Léon, elle partait sous n’importe quel prétexte, et, comme il ne l’attendait pas ce jour-lá, elle allait le chercher à son étude. [ ] Il fallait que Léon, chaque fois, lui racontât toute sa conduite, depuis le dernier rendez-vous. [ ] Il ne discutait pas ses idées; il acceptait tous ses goûts; il devenait sa maîtresse plutôt qu’elle n´était la sienne.»
«Binet sorria, o queixo curvado, as narinas dilatadas, e parecia perdido numa daquelas felicidades completas que decerto pertencem apenas às ocupações medíocres, que distraem o espírito por dificuldades fáceis, e o adormentam numa realização para além da qual nada mais se pode desejar.»
«A Lua, redonda e cor de púrpura, erguia-se na linha do horizonte, ao fundo da planície.
Subia rápida entre os ramos dos choupos, que a ocultavam a espaços, como uma cortina preta, esfarrapada.
Depois apareceu, deslumbrante de brancura, no céu vazio que ela iluminava; e então, abrandando a marcha, deixou cair sobre a ribeira uma grande mancha clara, que se dividia numa infinidade de estrelas, e o clarão argênteo parecia torcer-se ao fundo da água, como uma serpente sem cabeça, coberta de escamas luminosas.»
«Il savourait pour la première fois l’inexprimable délicatesse des élegances féminines. Jamais il n'avait rencontré cette grâce de langage, cette réserve du vêtement, ces poses de colombe assoupie. Il admirait l’exaltation de son âme et les dentelles de sa jupe. D’ailleurs, n’était-ce pas une femme du monde, et une femme marié! Une vraie maîtresse enfin? Par la diversité de son humeur, tour à tour mystique ou joyeuse, babillarde, taciturne, emportée, nonchalante, elle allait rappelant en lui mille désirs, évoquant des instincts ou des réminiscences. Elle était l’amoureuse de tous les romans, l’héroïne de tous les drames, le vague elle de tous les volumes de vers.»
«Comme ils aimaient cette bonne chambre pleine de gaieté, malgré sa splendeur un peu fanée! Ils retrouvaient toujours les meubles à leur place, et parfois des épingles à cheveux qu’elle avait oubliées, l’autre jeudi, sous le socle de la pendule. Ils déjeumaient au coin du feu, sur un petit guéridon incrusté de palissandre. Emma découpait, lui mettait les morceaux dans son assiette en débitant toutes sortes de chatteries; et elle riait d’un rire sonore et libertin quand la mousse du vin de Champagne débordait du verre léger sur les de ses doigts. Ils étaient si complètement perdus en la posséssion d’eux-mêmes, qu’ils se croyaient là dans leur maison particulière, et devant y vivre jusqu’à la mort, comme dux éternels jeunes époux.»
«Teriam só aquilo para dizer? Nos olhos de ambos, todavia, desenhava-se um diálogo mais sério; e, enquanto se esforçavam por encontrar frases banais, sentiam a mesma languidez invadi-los aos dois; era como um murmúrio da alma, profundo, ininterrupto, que dominava o das vozes. Tomados de espanto por aquela nova sensação de suavidade, não pensavam em comunicá-la nem em descobrir-lhe o motivo. As felicidades futuras, como as margens dos rios tropicais, projectam na imensidade que as precede a sua indolência natural, espécie de brisa perfumada, e nessa embriaguez adormecemos, sem nos inquiertarmos com o horizonte que ainda se não vê.»