Tudo o que vivêramos um dia fundiu-se com o que estava a ser vivido. Não na memória mas no puro espaço dos cinco sentidos. Havíamos estado no mundo, raso, um campo vazio de tojo seco.
Depois, alguém urbanizou o vazio, e havia casas e habitantes sobre o tojo. E eu, que estivera sempre presente, vi a dupla configuração de um campo, ou a sós em silêncio ou narrando esse meu ver.
O mais importante fruto que colhi dos escritos que até agora publiquei foi o facto de Vos terdes dignado lê-los e, por esse motivo, me terdes admitido no Vosso conhecimento, o que me deu ocasião de conhecer os Vossos dotes, que são tais que considero ser um serviço à humanidade propô-los como exemplo aos séculos vindouros.
Não faria sentido que eu adulasse ou afirmasse algo não suficientemente examinado (...); e sei que será mais grato à Vossa generosa modéstia o juízo não afectado e simples de um Filósofo do que os louvores adornados de homens lisonjeiros. (...)
É evidente que este sumo cuidado [o da vontade firme e constante de nada omitir (do que conduza) ao conhecimento do que é recto e de fazer tudo aquilo que julgar recto] existe em Vossa Alteza, pois nem as distracções da corte, nem a educação habitual que costuma condenar as raparigas à ignorância puderam impedir que investigásseis todas as boas artes e ciências. Além disso, a grande e incomparável perspicácia do Vosso espírito manifesta-se também no facto de terdes inspeccionado profundamente todos os segredos destas ciências e de em pouco tempo os terdes conhecido em pormenor. (...)
E quando observo que esse conhecimento tão diversificado e perfeito de todas as coisas não existe em algum sábio mestre já idoso que tenha dedicado muitos anos a meditar, mas sim numa jovem Princesa, que pela forma e pela idade mais faz lembrar uma das Graças do que a penetrante Minerva ou alguma das Musas, não posso deixar de ser tomado pela mais elevada admiração.
Por fim, verifico que não há nada que se requeira para a absoluta e sublime sabedoria, tanto da parte da vontade como da parte do conhecimento, que não brilhe nos Vossos costumes. Pois aparece neles a benignidade e a mansidão associadas a uma certa singular majestade, ferida por contínuas injúrias da sorte, mas nunca perturbada nem quebrada.
E esta sabedoria que em Vós observo de tal modo de mim exige veneração, que não só considero que devo dedicar-lhe e consagrar-lhe esta minha Filosofia (pois ela própria mais não é do que o estudo da sabedoria), como prefiro antes ser servidor devotíssimo de Vossa Sereníssima Alteza do que ser tido por filósofo.
«Mais pour procéder ici avec plus de franchise, je ne dissimulerai point que je me persuade qu’il n’y a rien autre chose par quoi nos sens soient touchés, que cette seule superficie qui est le terme des dimensions du corps qui est senti ou aperçu par les sens.
Car c’est en la superficie seule que se fait le contact, lequel est si nécessaire pour le sentiment, que j’estime que sans lui pas un de nos sens pourrait être mû.»
«Além disso, também a natureza me ensina que existem diversos corpos em volta do meu corpo, alguns dos quais devem ser procurados por mim, enquanto devo evitar outros. E, com certeza, concluo rectamente que do facto de sentir diversas espécies de cores, sons, odores, sabores, calor, dureza e coisa da mesma natureza, há nos corpos de que me chegam estas várias percepções dos sentidos diferenças correspondentes, embora talvez não semelhantes a elas. E, porque sucede que algumas daquelas percepções me são agradáveis, outras desagradáveis, é absolutamente certo que o meu corpo, ou melhor eu na totalidade, enquanto sou composto de corpo e espírito, posso ser afectado agradável e desagradávelmente pelos corpos circunjacentes.»
Descartes, Meditações sobre a filosofia primeira, 6ª Meditação [14]
«[...] Um relógio composto de rodas e pesos não observa menos cuidadosamente todas as leis da natureza quando é mal fabricado e não indica as horas certas do que quando satisfaz a todos os respeitos a intenção do artífice: analogamente, o mesmo se dá com o corpo do homem, se o considero como uma certa máquina equipada e composta de tal maneira, por ossos, nervos, músculos, veias, sangue e peles, que, mesmo que não existisse nela nenhum espírito, possuiria no entanto todos os movimentos que agora executa e não procedem do império da vontade e, por conseguinte, do espírito.»
Meditações sobre a filosofia primeira, 6ª Meditação [16]
«E assim, em primeiro lugar, senti que tinha uma cabeça, mãos, pés e os restantes membros de que consta aquele corpo que eu considerava como parte de mim próprio ou, possivelmente, como eu todo.
E senti que este corpo está entre muitos outros corpos, pelos quais pode ser afectado de modo favorável ou desfavorável, e eu media o favorável por um certo sentimento de prazer e o desfavorável por um sentimento de dor.»
Meditações sobre a filosofia primeira, 6ª Meditação [6]
«Mas, [ ] ainda que na verdade eu não possa pensar um Deus a não ser existente, nem um monte sem um vale, entretanto como de que pense um monte com vale não se conclui, com certeza, que existe no mundo algum monte também não parece concluir-se que Deus existe, pelo facto de eu pensar Deus como existente.
Com efeito, o meu pensamento não impõe necessidade às coisas: assim como me é lícito imaginar um cavalo alado, mesmo que nenhum cavalo tenha asas,talvez eu também possa atribuir a existência a Deus, embora não exista nenhum Deus.»
Descartes, Meditações sobre a filosofia primeira, 5ª Meditação [9]
[...] Além disso, se presto atenção, concebo também inúmeras particularidades sobre as figuras, o número, o movimento, e coisas semelhantes, cuja verdade é tão clara e consentânea com a minha natureza que, logo que as começo a descobrir, parece-me que não aprendo qualquer coisa de novo, mas que, ao contrário, me recordo do que já anteriormente sabia [...]
Un petit poisson, un petit oiseau S'aimaient d'amour tendre Mais comment s'y prendre Quand on est dans l'eau Un petit poisson, un petit oiseau S'aimaient d'amour tendre Mais comment s'y prendre Quand on est là-haut
Quand on est là-haut Perdu aux creux des nuages On regarde en bas pour voir Son amour qui nage Et l'on voudrait bien changer Ses ailes en nageoires Les arbres en plongeoir Le ciel en baignoire
Un petit poisson, un petit oiseau S'aimaient d'amour tendre Mais comment s'y prendre Quand on est là-haut Un petit poisson, un petit oiseau S'aimaient d'amour tendre Mais comment s'y prendre Quand on est dans l'eau
Quand on est dans l'eau On veut que vienne l'orage Qui apporterait du ciel Bien plus qu'un message Qui pourrait d'un coup Changer au cours du voyage Des plumes en écailles Des ailes en chandail Des algues en paille.
Há dias, o Prof. António Costa e Silva, do IST, deu uma excelente e esperançosa entrevista na SIC.Notícias no programa "Negócios da Semana" de José Gomes Ferreira.
A matriz energética do futuro acentuará a sobreposição da condição "produtor-consumidor"; a micro-geração de energia expandir-se-á; no limite, idealmente, o próprio consumidor produziria a energia que consome! :)). Por exemplo, os carros eléctricos do futuro, porque não haveriam de ter tejadilho com painel solar e ventoinha de produção de energia eólica, do próprio vento da deslocação automóvel, carregando em contínuo a bateria de lítio de que até há minas
Le temps fuit et sans retour Emporte nos tendresses, Loin de cet heureux séjour Le temps fuit sans retour.
Zéphyrs embrasés, Versez-nous vos caresses, Zéphyrs embrasés, Donnez-nous vos baisers! vos baisers! vos baisers! Ah!
Belle nuit, ô nuit d'amour, Souris à nos ivresses, Nuit plus douce que le jour, Ô belle nuit d'amour! Ah! Souris à nos ivresses! Nuit d'amour, ô nuit d'amour! Ah! ah! ah! ah! ah! ah! ah! ah! ah! ah!
Outra bela canção de Maria del Mar Bonet indicada por eli:):
Cançión de la bruixa cremada
A Maria del Mar Bonet
Bruixa, que és de matinada, / Bruja, que es de mañana, ja surten els muriacs / ja salen los murciélagos que et fan nit a la finestra / que te velan la ventana i t’enramen el portal. / y te enraman el portal
El portal t’enramen d’arços / El portal te enraman de espinos i el balcó de tempestats. / y el balcón de tempestades. Surt, la bruixa, a trenc de dia / Sale, la bruja, al apuntar el día com una ombra al camí ral. / como una sombra en el camino real
Bruixa, arrenca’t de les trenes, / Bruja, arráncate de las trenzas, que s’acosta el Sol botxí, / que se acerca el sol verdugo amb el seu arc de sagetes / con su arco se flechas mulladetes de verí. / mojaditas de veneno.
De la teva cabellera, / De tu cabellera en farem coixí daurat / haremos cojín dorado per als xiquets de la vila / para los mozos del pueblo que la son els has robat. / a quien les robaste el sueño.
Bruixa, els teus ulls cremen massa: / Bruja, tus ojos queman demasiado: per això els darem al foc. / por eso los prenderemos. Cap fadrí darrere cendra / Ningún muchacho tras la ceniza perdrà els passos ni la sort. / perderá ni pasos ni suerte.
Bruixa, plou sobre la vila. /Bruja, llueve en el pueblo. Ja sols resta el teu vestit. / Sólo queda tu vestido. A pleret la nit s’acosta / A sus anchas la noche se acerca tota negra d’estalzim. / toda negra de tizne.
Michel Onfray, a potência de existir («La puissance d'exister», 2006) trad. José Luís Pérez Campo da Comunicação, Lisboa, 2009 Li. Excelente manual hedonista que nos alerta contra as múltiplas atitudes nihilistas e alienantes que pululam em algumas doutrinas filosóficas. Nada objecto à posição de Onfray antes reconheço, como ele, a pura imanência de toda a sabedoria. Contudo, para lá da busca da felicidade, é legítimo acurar e acarinhar a grande curiosidade do ser humano em conhecer o real e perscrutar a matéria do mundo que "depois do fim e para lá do fim do homem e do indivíduo" visa enunciar os «grandes discursos» da representação do mundo.
No número 01 da revista “Próximo Futuro” da Fundação Calouste Gulbenkian encontrei um belo poema da escritora ítalo-somali Cristina Ali Farah
Ei-lo em versão trilingue
Espera, deixa-me atravessar o limiar de olhos fechados a cadeira do rei está vazia, a luva mostra a investidura o poder está desconexo Vendas e desvendas, olhar oblíquo, ubíquo Como é fácil, afinal, enganar à vista (escondes o braço imputado) Ser mestre dos confins do vazio
Cavei a terra com as mãos nuas procurando o segredo do que fica de três mil virgens de terracota, veias de água, ninhos e túmulos por baixo de camadas de areia e pele Os meus dedos desenham fragmentos e espelhos, cancelados na memória
Volto a subir as pulsações do tempo, minha mãe, a mãe da minha mãe, matrioskas perfuradas Dêem-me uma vela para que eu possa olhar dentro E recompor o mapa do amor nos corpos desconsagrados
CRISTINA ALI FARAH Tradução: Livia Apa
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Wait, let me cross the threshold, my eyes closed, the king’s chair is empty, the glove shows the investiture, the power is disconnected Veils and unveils, looking oblique, ubiquitous How easy it is, after all, to deceive the sight (you hide your imputed arm) to be master of the confines of the void
I dug the earth with bare hands seeking the secret of what remains of three thousand terracotta virgins, veins of water, nests and tombs ’neath strata of sand and skin My fingers draw fragments and mirrors, cancelled from my memory
I reclimb the beats of time My mother, my mother’s mother, perforated matryoshkas Give me a candle so that I can I can look inside And recompose the map of love in desecrated bodies
(Translation: John Elliott)
----------- // ------------ Espera, déjame trasponer el umbral con los ojos cerrados El trono del rey está vacío, el guante muestra la investidura el poder está desmembrado Encubres y desvelas, mirada oblicua, ubicua Es tan fácil, sin embargo, engañar a la vista (escondes el brazo imputado) amaestra los confines del vacío
He cavado la tierra con las manos desnudas buscando el secreto de lo que resta de tres mil vírgenes de terracota, venas de agua, nidos y tumbas bajo capas de arena y piel Mis dedos dibujan fragmentos y espejos, cancelados en la memoria
Vuelvo a subir las pulsaciones del tiempo, mi madre, la madre de mi madre, matrioskas perforadas Denme una vela para que pueda mirar dentro Y recomponer el mapa del amor en los cuerpos desconsagrados
Marie-Hélène, óleo sobre tela de Arpad Szenes, 1942
TERRAÇO
Por mais que vos olhe vos esqueço. Não sois mais do que formas desordenadas. Riscos díspares como peles de felinos. Em cadeirões familiares distorcidos.
(fiama hasse pais brandão)
agosto 01, 2009
in Catharsis
haunt me in my dreams if you please your breath is with me now and always it's like a breeze
so should you ever doubt me if it's help that you need never dare to doubt me
and if you want to sleep i'll be quiet like an angel as quiet as your soul could be if you only knew you had a friend like me
so should you ever doubt me if it's help that you need never dare to doubt me