setembro 10, 2009

Só criando. — O que me custou e me custa ainda constantemente mais sofrimento, é dar-me conta de que é infinitamente mais importante conhecer o nome das coisas do que saber o que elas são. A sua reputação e o seu nome, o seu aspecto e a sua importância, a sua medida tradicional, o seu peso geralmente aceite — todas as qualificações que estiveram na origem dos frutos do erro e do capricho, na sua maior parte, roupagens que se lançaram sobre elas sem tomar a precaução de as adaptar à sua essência e nem sequer à sua cor de pele — tudo isso, à força de ser acreditado, de se transmitir, de se fortificar em cada nova geração, acabou por formar o seu corpo; a aparência primitiva acaba sempre por se tornar a essência e fazer o efeito da essência! Bem louco quem acreditasse que basta recordar essa origem e mostrar esse véu nebuloso da ilusão para destruir o mundo que passa por essencial, a que se chama «realidade»! Só criando o podemos aniquilar!... Mas não esqueçamos também isto: é que basta forjar nomes novos, novas apreciações e novas probabilidades para criar com o tempo também «coisas» novas.

(Gaia Ciência, Livro II, § 58)

2 comentários:

Unknown disse...

O filme «O último tango em Paris» é a demonstração mais inesperada da importância que damos ao «nome».

O nosso entendimento do mundo organiza-se em torno do «nome». Ao chamar-mos «Deus» ou «Acaso» ao que não sabemos explicar, cessamos a angústia da ignorância; «matéria negra» ou «energia negra», meros parâmetros matemáticos sem qq possível contrapartida física, tornaram-se «reais» porque têm um nome.

No fundo, a adesão ao «nome» divide as pessoas em dois grupos: os que vivem em função do «nome» e os que não dependem dele; estes são os pensadores autónomos, aos outros chamo «crentes», mesmo os que se consideram ateus.

Os dois tipos devem fazer ambos falta ao funcionamento da humanidade, cada um com o seu papel; e coexistem bem, apenas os fundamentalistas dum ou doutro tipo entram em conflito com todas as pessoas do outro tipo.

vbm disse...

...

Mas olha que, em lógica, e na matemática, se escolhermos um certo número de proposições de partida ou variáveis explicativas, podemos designar o que de uma e de outras resulte como o efeito que esse sistema opera, dando-lhe então um nome o qual não tem outra essência do que a operação que o faz surgir, mas que tende a usurpar essa genealogia pela simples designação do resultado. Ora, como diz Nietzsche, só criando outro modo de explicação se cria com o tempo uma «coisa» nova.