novembro 27, 2007

Thomas Mann, "As cabeças trocadas" - 34

«Assim, em silêncio, prosseguiam a jornada,
mas a respiração dos três acelerava-se-lhes,
como se tivessem corrido.

Uma pessoa dotada de clarividência teria,
certamente, percebido a sombra
que sobre eles pairava
qual asa negra.»

op.cit., p.71

2 comentários:

A disse...

Vasco...

sabes que encontrei, pela primeira vez, Thomas Mann e o seu "As cabeças trocadas", numa pequena papelaria-livraria de Faro, a 7 de Novembro de 1987. tinha 16 anos e fazia rádio (uma paixão!).
levei-o comigo para casa e li-o num só fôlego, e ainda hoje o referencio mentalmente (em doçura e sorrisos) e aos amigos.

olho-o agora (fui a correr à estante...), numa edição "Livros do Brasil" Lisboa, nº. 161 da Colecção Dois Mundos, amarelecido. o meu livro.

foi por aí que descobri Thomas Mann, maravilhada pela obra...
e a surpresa de te perceber também tu, amigo tão querido, com ela envolvido.

(encontramo-nos sempre, não é? nas práticas silênciosas e anónimas do existir... é mesmo assim...)

Trago-te, dele, algumas palavras que registei no tempo:

"Há uma beleza espiritual e há outra beleza que fala aos sentidos. Certas pessoas pretendem que o belo pertence exclusivamente ao campo dos sentidos, separando dele por completo o espiritual, de modo que o nosso mundo apresente uma cisão entre os dois. Nisso também se baseia o ensinamento védico: "Apenas por dois modos a felicidade é cognoscível em todo o Universo: a que nos vem das alegrias do corpo e a que nos vem da paz redentora do espírito." Desta doutrina, no entanto, segue-se que o espiritual não se acha, para o belo, na mesma relação em que o belo se encontra para o feio e que, só em certas condições, se confunde com este. O espiritual não é sinónimo de beleza pelo conhecimento e pelo amor do belo, amor este que se exprime em beleza espiritual. Tal amor, em absoluto, não é absurdo ou sem esperança, pois, pela lei da atracção dos opostos, o belo por sua vez anseia pelo espiritual, admirando-o e recebendo-lhe com agrado a corte.
Este mundo não está constituído de tal modo que o espírito esteja fadado a amar apenas o espiritual, nem a beleza unicamente votada a procurar o belo.
Na verdade, o próprio contraste entre os dois indica, com clareza ao mesmo tempo espiritual e bela, que a meta do Mundo é a união entre o espírito e a beleza, isto é, uma felicidade não mais dividida porém total e consumada. E a nossa narrativa nada mais é do que uma ilustração dos malogros e desvios que acompanham o esforço para atingir a meta."
(op.cit., p.164/165).

acompanho-te...

ana

vbm disse...

Gira coincidência, Ana! "Cabeças trocadas" as nossas :)! Neste conto exótico e sensual de Thomas Mann, impressiona-me o entrelaçamento do corpo e da mente no sentimento da paixão do amor. Por muito que se admire a qualidade intelectual do amado, o desejo do corpo do amigo enleia os sentidos na submissão do desejo. Mas, nem a reunião no amado desse corpo esbelto com a mente brilhante, atenua a saudade do amado de atributos preteridos... Inextricável entrelaçamento da mente e do corpo no acto e no destino de amar...